quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Desejo


que regressem os dias calmos,

sem agitação

nem frio nem vento,

para que cada momento

seja um pedaço

do Céu,

onde o destino sou eu.




terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Velejando


O dia corre na azáfama dos afazeres

como um barco

à vela

que, deitado ao mar,

procura aquela ilha,

onde o Rei,

em passos inquietos,

sonha sonhos sempre despertos.




segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Cidade


Sonho uma praça e ruas estreitas,

sempre que amanheço

na cidade.

Mas tal não é verdade.

E entre a realidade e o sonho

há uma imensidão,

tanta e tão grande, quanto uma mão em outra mão.











domingo, 24 de fevereiro de 2013

Anónimo e vazio


o dia acaba.

E o sol que se escoa,

em espiral, vai lá longe devagarinho acordar

outras gentes.


Mas agora, junto da lareira acesa, o Caminheiro

(como sempre) fala só do que é futuro...

e, então, subitamente,

no dia que acabou,

o amanhã antecipa a jornada

tanto, que nem a noite é precisa

para se saber que outro dia vai nascer.
















sábado, 23 de fevereiro de 2013

Como um salgueiro


consciente do destino das águas

que correm sem regressar

jamais,

oiço o tic-tac dos segundos

que parecem sempre trazer novos mundos

no interminável rol das horas.






sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

Se hoje


é mais escuro o céu,

é porque na morada de zeus

se tece

a trama da vida

e como uma memória

se escreve toda a história

dos homens,

distantes e alheios,

do que os deuses são mensageiros.











quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Verde sombra


Tal como os campos florescem

também a cidade

germina

no formigueiro do meio do dia,

mas qual será a planta

plantada?,

no asfalto negro e vazio

longe, tão longe, da correnteza do rio.






quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Vigília


O começo é  incerto,

na noite, em larga medida,

quando o despertar

não configura o sentido da vida.


Por isso, no silêncio da imensidão, evoco o Sul e aqueles campos,

onde a madrugada

é a calma

nos corpos e nas almas,

e o dia vem da escuridão nascendo

e sabe-se bem que a noite foi morrendo.



terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Finisterra


Quem dera ser a onda

que varre aquela encosta

e ir e voltar

crescendo

até despejar na areia

a ausência de todo o medo.



domingo, 17 de fevereiro de 2013

Serenidade


É bem e é certo que tudo seja assim

como é. Tanto quanto cada erro que não pode

ser apagado. Tanto como esta manhã em que choveu

e no longe o céu tremeu. Tanto quanto cada tua despedida

no caminho de outra vida. Tanto como lembrando

o sonho justo do que não aconteceu

e que permanece como dádiva

prometida,

ainda nunca vivida.





É inverno


ainda no limbo das sementes

e o renque de árvores

que à minha janela espreita,

despida de toda a folhagem,

parece eternizar esta estação do tempo.


Tal os homens com quem me cruzo,

fechados, tristes, cabisbaixos,

é inverno

na alma da nação

quando falta dizer: «Não. Basta de tanta traição!»





sábado, 16 de fevereiro de 2013

Claridade


Aqui, entre o assombro de mais claros

serem os dias e a dura realidade do chão que pisamos,

ergue-se uma palavra apenas:

«Grândola, vila morena».


Então, sem mais nada não,

na labuta dos dias que correm,

lembra-se o povo que não morrem

as verdadeiras esperanças do homem.



sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Brinca comigo


como se o Tempo inteiro

parasse

e o teu riso cândido de outrora

brilhasse mais que aquela aurora

toda branca, no céu sereno,

quando tu eras pequeno.




quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Algures


O outro habita

aquele lugar em mim

já tão distante,

que me esqueço de querer

tal pedaço

por desistência e cansaço.



quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

As minhas dunas


são feitas do nevoeiro

que se levanta das fráguas

quando não há horizonte para lá

do monte.

E, então, como num abraço de deus,

as dunas envolvem o meu ser,

deixando no meu coração

toda a força firme da razão.




terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

Insónia


no despertar da neblina densa

de que a noite é feita,

movendo cada fragmento de pensamento

para o cume

da cadência lenta das horas.


Por isso, agora, que o dia rompeu,

rasgando o silêncio,

admira-me que chovesse

e que o Sol entristecesse

sem que nada de novo viesse nesta hora.





segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

Aquela esquina


entre duas ruas lembra-me,

nem sei bem porquê,

que quando era pequenina

me equilibrava na borda do passeio

como se não houvesse mais nada pelo meio.


Hoje, contudo, é outra a sina,

longe do andar de menina,

meus pés firmemente se movem no chão,

mas sem sonho

caminham em vão.

domingo, 10 de fevereiro de 2013

Simplesmente


Dói-me a cabeça de tanto procurar,

no presente, aquele futuro

de gente

na aparência tão perfeita.


Mas, minha alma rarefeita,

alma de juncos e de pedras,

está condenada à escravidão

do silêncio sem paixão.




sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Aquela folha


rejeitada, escrita e mal amada,

está fechada na memória

e, se a releio,

não tem história,

porque só a folha novel novíssima,

onde se escreve o de hoje sentimento,

resiste à força do vento

e macera

qualquer tormento.


quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Página breve


Que dia tão liso

a despertar novos pensamentos!


Verticalidade de mim

num assombro de quem não é assim!


E, como numa contradança,

o mundo à minha volta balança,

esgueirando-se

na intermitência dos fragmentos

que levam para tão longe tanta gente!







quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Uma parte de mim


clama por um novo olhar,

certa que a lentidão

no desenrolar de cada ação

serve a Saturno

o mestre dos caminhos

onde o tempo

não é perdido.








terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Nos pátios


do centenário edifício, em Lisboa,

brilha o sol tanto

que os plátanos, estranhamente,

parecem viver somente

para acolher,

em cada geração,

os seres em gestação.


E se alguém se admira por ver uma árvore

gigantesca despida

é porque tão pouco sabe entender

que há uma roda na vida.



segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Inteireza


Se, no acaso da sorte,

os deuses nos forem favoráveis,

deixemos que sopre o vento Norte

na sua rajada imparável.


Talvez, que, se for a sorte ordeira,

se aprenda a lição

de às vezes dizer «Não».

E, no assombro de mais claros serem agora

os dias, talvez, nós alcancemos

o prodígio

de parar mesmo à beira do precipício.








domingo, 3 de fevereiro de 2013

Silêncio


na tarde ao despontar

do anoitecer.

Mistério do destino

que torna tão silenciosas as casas

no passar dos anos

como se na linha do tempo

só ficasse o pensamento.






sábado, 2 de fevereiro de 2013

Que penhascos


sob o céu dos naufragantes?

Por isso, na correnteza

do ângulo reto

da minha janela,

observo lá ao longe

uma esgueira de mar,

sem saber

onde estão os grandes rochedos

e os extremos medos.



sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Constelação


Por um murmúrio crescente

das estrelas,

no céu à noite brilha

com elas o meu pensamento

que há de ser

o verdadeiro ecoar

deste entardecer

que me dá viver.