Na minha rua

Minha Alma é branca e leve.

Tão leve. Apenas tão leve,

que uma suave brisa

passando

a desfolha

como Rosa num roseiral

plantada num quintal.

Travessia

Só para Te encontrar,

Caminho -

e, nesse destino de Alma errante,

sou apenas Navegante.

Sementeira

Ecoa, por um breve instante,

a Luz da Palavra.

E este eco de claridade

é uma Luz

tornada realidade

da qual brota

simples Verdade

o Mundo e a Humanidade.

Corais

É uma coisa de Mar

este Abraçar -

e num suave instante

é como se todo o Universo

fosse inteiro

e mais verdadeiro.

O agitar de folhas

Em prece,

o dia anoitece

e só o Sonho não esquece

de nascer e acordar

como se navegasse à deriva

pelo Mundo

procurando a Ilha prometida -

nova esperança

nova vida.

Memória obscura

Na grande imensidão deste deserto

lastima-se e chora

o meu Coração -

todo o tempo passado crucificado

e perdido

como se tivesse sido para sempre esquecido.

No deserto do mundo

É quase no silêncio mais profundo

que a minha Alma voga

no Mundo - e se teima em Te encontrar

é porque tem a lembrança

de Criança

ainda viva no pensamento

e esquecida da desdita e do tormento.

Rima imperfeita

Tudo passa -

e é já memória -

é esta a medida da vida -

e tal como numa roseira florida

murcham momentos e instantes

e Sonhos inconstantes.

Perfeição

Uma nuvem inquieta

tolda o meu pensamento -

mas logo passa

como lágrima vertida

como chuva colorida.

Leveza

Grande é o Mistério

do sonho

e da noite - e, como na morte,

há um Sul e um Norte.

A cor anil

Amo o Silêncio

e, nesta tarde de chuva,

comove-me a Paz que habita

todo o meu Ser - cor de viver.

Tanta estrada

Ainda tanta estrada

para andar

e, no entanto, cheguei -

e é um fundo de Mar,

é um chão e uma imensidão,

suave, doce, comoção

no abrir do Coração.

Brisa marinha

Suavemente, bem sei,

corre o tempo

- e eu sedenta de alcançar

a eterna morada onde eternamente morar.

Assombro

Escurece

tão de repente,

que até parece que a Alma

sente e se entristece,

no assombro da noite que vem,

sem ser Além.

Outros lugares

Busco a Palavra

mais Pura - Poema perfeito -

no longe tão perto do Teu peito.

Oração

Era um tempo de Mar,

quando, no branco da espuma,

eu Sonhei - e, na névoa e na maresia,

um destino se Cumpria.

A Certeza

Debruço-me da janela

aberta sobre o horizonte

e o Longe está inteiro dentro de Mim -

e oiço, brevemente, a Tua voz

e que diz «neste lugar, somos sós».

Instante

E, subitamente, um fulgor

de Luz -

quieta Melodia.

Horizonte na noite

Tateio por entre as Sombras

como quem percorre

um lance

já velho de Caminho -

e pedra a pedra

minha Alma discorre

sobre o tempo que se move.

Silêncio apenas

É de neblina este sonho

na noite - sem estrada nem caminho

para encontrar um mais vívido despertar.

É de Paz...

Murmúrio de fogo

a arder

no espaço do meu Ser -

mas é de Paz esta litania assombrosa

de colher num incêndio uma Rosa.

Romaria

Na derradeira hora,

quero um lúcido instante

de certeza -

breve, muito breve,

que a minha Alma leve.

Todos os lugares

Em todos os lugares,

há um amanhecer e um entardecer -

memória fugitiva

que é sinal

de que no Mundo não há mal.

Outonal

Da natureza não colho

senão a suavidade

de um silêncio verdadeiro -

Alma que se completa

e que desperta.

Ausência

Na Tua ausência,

tenho o horizonte mais Belo de Luz

dentro de Mim -

memória de Ti, sem fim.

Devagar, o Tempo

Nesse assomo de eternidade,

que é a Esperança,

encontra-se todo o movimento do Mundo -

e aí baloiça uma Criança.

Perfeito Silêncio

Acordo na noite

e procuro, em Mim,

o rasto enigmático do Sonho...

mas o diamante forjado no seio da escuridão

não luz mais

- bravio silêncio...

O Caminho

Eis o Sul de Mim,

que Te ofereço, meu Amor,

e nessa totalidade do meu Ser

está todo o meu viver,

está a alegria e a dor

e o orvalho, o penhor.

Castelo de areia

É branca e límpida a madrugada -

assombro de Luz

e mais nada.

Sei de um poente...

Sei de um Poente

que é um momento eterno

e raro na Luz do entardecer

que é, meu Amor,

quando um Sol dentro de nós

é mais, é maior,

mesmo se estamos sós.

Recordação

Vem, Caminhante, dá-me

a tua Mão

forte e firme

e vamos percorrer

as mais longas distâncias deste Mundo

como se numa súbita alvorada

fosse nova vida encontrada.

A Ventura

Um deserto atravessei

e, dentro de Mim,

encontrei o lugar do bom repouso.


Sossega, agora, Coração,

e na plena imensidão da Ventura

brilha como a jóia mais pura.

Simplicidade

Dos deuses não saberei

que destino no aço me forjaram -

mas deve haver uma lei,

que também os deuses sujeita,

e que desfaz

a imensidão da dor,

havendo no Coração Amor.

A Colina

Este chão de terra mais firme

eu piso.

E, como se fosse um mendigo errante,

caminhando de porta em porta,

colho a esmola da Vida -

uma colina florida

a cada instante no meu Coração erguida.

Poeira

Estes versos,

poeira de alguma estrada percorrida,

são o meu sal da vida -

e tanto é o Mar revoltoso

que o Poema, nau de um marinheiro só,

se embarga como se embarga a minha voz.

A realidade das coisas

Chove,

neste anoitecer,

dia claro que finda.


Não amanheceu ainda.

Não é o dia sem noite também.

É uma simples angústia que renasce e vem.

Na azul distância

No meu Céu,

onde os deuses vagueiam e se demoram,

o Teu gentil Coração

abre-se em Flor

num despontar de Amor.

Na ilusão do Sonho

É quase de neblina

este chão

sem firmeza

e só imensidão

que clareia o meu Coração.


Antes pisasse fráguas e penedos,

sólidos rochedos,

de uma angústia pesada,

e numa amargura macerada.

Como um fio de água correndo

Como um fio de água correndo

e buscando a lonjura

de um Mar,

assim meu pensamento

procura esse infinito de espanto

que como um manto

eu quero Abraçar.

Primeiro dia

Sonhei-Te, como num cântico

de Amor se forja

a palavra

do perfeito Amanhecer

no antes do despertar.


E, agora, Caminhante, o Sonho lúcido

é um Sol de levante

que os nossos Corações espante.

Acalmou-se o vento.

Brisa suave num incêndio de Luz.

Ilusão de madrugada.

Quando, no martírio da dor, a vida se abre em Flor.

Quando é a hora de partir, parte.

Segue a Rota do Caminho. E o dia amanhece e floresce.

Não busques.

Se o teu dom é o de permanecer. Força de viver.

Mar de Paz. Oceano de Paz.

Abraço e Luz.

Sublime o amanhecer.

Gota de orvalho.

Lance a lance, o Caminho se percorre.

Como Sol que entardece - divina Prece.

No sonho, a Ave inicial...

Voo translúcido das Almas perfeitas.

Ouve o vento. Ouve apenas o vento.

Não penses em nada mais. Ouve o vento.

É este o tempo exato. Raro. Completo. Perfeito.

Coração que, em compasso, bate no peito.

Terra e Céu.

No abismo do Amor.

É em silêncio que floresce a Alma.

Vaso de vidro que um pouco do Universo contém.

Lembrança do tempo ser eterno.

Mais pequeno e maior do que Nós.

Horizonte.

Num para além jorram as fontes.

Coisa de Mar, um búzio ou uma Caravela.

Singular perfeição.

A voz terna, tão calma.

Cadência de Mar. Lembrança de Mar.

Só Silêncio e Mar.

Imensidão de Luz!

Tecedeira que tece e destece.

Sombra da vida.

Colhe a flor, num Abraço.

E deixa que lento passe o tempo.

Vence o Amor aquela espada de dor.

E, brilhando uma luz, o meu Coração seduz.

Não queiras senão o fruto inteiro.

Em cada momento um momento de Verdade.

Eternamente - o Sonho.

Limbo. Antemanhã de um despertar.

Pisa bem o chão do caminho.

Pisa bem cada pedra.

O ramo do salgueiro não quebra.

Dócil, e terno, suporta qualquer inverno.

Em motim, o pensamento.

Rebeldia neste silêncio.

É breve todo o passado.

Tão breve, que um instante de memória o contém.

Dia do mar.

Poetas náufragos e sós.

A vigília de pedra

Tudo passa.


E, naquela eternidade

sem fim,

que é a morte,

alcançarei a sina e a sorte.

O semeador

Despeço-me da escuridão

e do silêncio

mais agreste da noite

e lanço na madrugada

a semente

que há de florescer

como um canto de um novo dia -

regresso à claridade

das manhãs frias

para encontrar

nos rostos que despertam

a suma essência que me completa.

A árvore dos pássaros

O silêncio rodeia-me

e abraça-me

como uma árvore acarinha

aquela avezinha de asa partida

no seu canto de despedida.

Esplendor na Alma

Vieste da extensa e doirada planície

do Céu habitar o meu Coração -

cadinho só de Amor e Paixão,

já venceste

e conquistaste

o que era só solidão.

Apago as nuvens

O sonho da noite

perpassa ainda no meu rosto

e afaga-me feliz num sinal de esperança.


Mantra que se repete,

apago as nuvens,

apago as nuvens,

apago as nuvens,

até que o Coração desperte.

Silêncio. E paz. Mais silêncio. Como quem renasce da agonia e da dor sem nenhum clamor.

Peregrino na alma. E o longe... cada passada encurta a distância dentro de cada um de nós.

A cidade outra. Gentes, movimentos, diferentes. Amplitude do espaço e do tempo... ser, e permanecer, em outro lugar.

Um dia mais. Apenas um dia. Como quem ao universo confia a dor e a alegria.

A memória grata do passado que foi tolda de negrume o coração. Nostalgia. Raiz de ser e se perder.

Ritmo e cadência. E o tambor. Compasso do coração numa mesma batida. O compasso da vida.

A casa. E o silêncio da paz perdida e reencontrada. Sopro de vida. Estrada de beira mar, onde há um mundo inteiro para encontrar.

Ofício de poeta. Como quem procura, na existência, o mais profundo da suma essência. Luz, sombra, movimento e lentidão. E as dores da Paixão.

E, então, subitamente, o pássaro voou no meu peito. Origami perfeito.

O verde calmo da colina... momento de graça. Nele, pastoreia o meu Coração na luz branda da tarde. Eterna primavera.

Nas árvores, o silêncio nos ramos. Hora fugitiva. Angústia do anoitecer.

Apetece a letargia. Melancólico e triste cada um destes dias passa. Passa porque passa. Coração esquecido.

Mágico, o pensamento materializa-se em formas, cores, árvores, flores. Mago de mil encantos. Verbo silencioso e criador de mundos.

Cada movimento da rotina quotidiana é um trecho do filme de uma vida humana. Raio de sol. Nuvem sombria. Fluxo e refluxo do mar. Maresia.

Um rosto no espelho. Um rosto na multidão. Do ângulo do observador, que a si mesmo observa, o destino é singular. Pó de estrelas.

Mais leves, as árvores podadas esquecem o martírio dos ramos sacrificados. Também assim é na natureza do homem.

Coração compassado. Fiel de balança que exatamente afere o peso de cada dia. Mestre de inúmeros rostos.

Concretizamos os sonhos futuros em cada ínfimo passo do presente. Jornada perfeita. Fruto que amadurece e se colhe a cada instante. Voo de ave.

Regressar à página em branco. Desafio e provocação. Orvalho que dessedenta.

Suspiro de sombra... mas, depois, o novelo dos pensamentos ganha uma forma redonda e perfeita, como se se fizesse uma descoberta e o mundo fosse uma janela aberta.

Interminável silêncio. Quando os pensamentos abraçam todo o nosso ser e não há senão um silencioso permanecer.

Entardece mais, quando dolente, e sem vontade, o homem dormita no sonho que arde.

Os meus passos no caminho e os teus passos no caminho, sem beira de estrada.

Era uma fotografia coberta de tempo. Amarelecida. Perdido o sopro da vida dos que a amaram. Casa onde já ninguém mora nem chora.

A mulher tateia, prisioneira da vida, até que lhe cresçam as asas de voar. Lagarta. Crisálida. Até ser, enfim, borboleta.

O caminho do pensamento. Viagem.

Horas tardias. Esgotantes. Horas dos amantes. Quando, no sono acordado, outro é o mundo e o pecado.

Em tempo de serem mais claros os dias, nasci. Alvorada pressentida, quando, no mundo, me cruzei com a vida.

Final de tarde. Sem mar nem céu. Tudo é terra silente numa multidão de palavras.

A espada e o cavaleiro e a rosa. Sonho em verso e em prosa. E, neste romance, o princípio e o fim é um lugar de Mim.

Hábito de silêncio. E escutar, cá dentro de nós, cada som e cada voz. Colcheia que o mundo sustém.

Queria ser um lugar. Um lugar de estar. Uma alta montanha ou então um rio, como quem aceita um desafio.

Abriu as asas e voou. Vertigem de imensidão.

Simplesmente belo. Um domingo a entardecer, um sol pálido a morrer e, lá ao longe, na miragem, uma caravela.

Pesa a vida, se não amanhecer no Coração. Tarde de verão límpida. Loiça lavada no alguidar a secar.

A tecedeira de destinos vai tecendo a cada momento o amanhã. Nuvem branca de cada instante.

Dá um passo. Apenas um passo. E depois outro passo. E outro e outro. É o início.

Olhar a forma das coisas. Demorar o olhar. Uma e outra vez. Até que o olhar alcance a abrangência do universo, coisa a coisa, ser a ser. Momento momento.

Sonho ou pesadelo passageiros. No corre corre do sono, o homem desperta. Janela aberta para a alma escancarada.

Longe tão perto.  Algibeira rota, que deixa cair, gota a gota, cada instante da vida. Perto tão longe.

O abismo, a queda. A escuridão. Dízimo anterior à Luz.

Num lugar, uma árvore; noutro lugar, um pássaro; noutro, ainda, uma estrela... Imensidão de ser raiz.

A espaços a cidade parece até adormecida. Sono da vida. Dormência de quem do sonho se esqueceu.

Antes do caminho eterno dos deuses imortais, há o caminho do tempo que não volta mais.

Este é o tempo da espera... do infinito tu vens. E cada coisa se habita de um sossego e de um afeto como se o oceano fosse o teto. 

Impermanência. Quase um instante a ser eterno. Quase eterno o amanhecer de um novo ano a viver.