segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Através da vidraça




Que seja incógnito

este tempo que me amortalha

hoje,

para que, depois, no alvor de uma manhã

mais clara,

rebrilhe o gotejar do pensamento,

fímbria distante,

a preencher um outro instante.




domingo, 29 de setembro de 2013

Irrefletir




Cerca-me a neblina

e pesa-me o cinzento do céu

na minha alma adentro.


Desamparo de já não ser criança;

e de estar a confiança no mais alto dos penedos

aonde eu não chegarei tão cedo.


Desamparo desta humana condição

agrilhoada sempre à palavra «não».






sexta-feira, 27 de setembro de 2013

Retrato




Era em sépia,

numa correnteza de corais

e maresia, que o rosto se construía

pedaço a pedaço

como se do tempo e pelo espaço

viesse ter ao meu regaço.


E, sem a frialdade da inércia de um momento,

a tua face trigueira

lembra-me, num encantamento, uma hora primeira

tão igual  à derradeira.






quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Inicial




Quando as minhas palavras

se encontraram com as tuas palavras,

criou-se na brevidade súbita um poema

que falava da vindima

com que na vida se firma

mesmo a solidão mais pequena.







quarta-feira, 25 de setembro de 2013

Mudez




Do alto destes muros,

cercando toda a cidade,

há um silêncio mudo que me invade

e que esconde toda a revolta...

pela palavra que não se solta

a denunciar

que é tão frágil este viver

mudo

no meio de tanto absurdo.



segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Nova luz




É agora

anunciado o outono

dentro de mim

e sei, pela lição dos tempos,

que será tão ameno e suave

como as folhas que tombam

ao de leve no chão,

caídas

do mais simples coração.







domingo, 22 de setembro de 2013

Chegaste




e és o novo outono,

luzente,

em volta da gente.


Por isso, respirarei

mais suavemente a saudade

do futuro a haver

a cada amanhecer.



sábado, 21 de setembro de 2013

Candente esperança




Vem comigo visitar

aquele jardim à beira do mar.

Nele a paz

avança em cada esquina

como menina

eternamente criança

que no sorriso tem a esperança.



quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Sem pressa




de partir, persiste o verão

e, então, balança o meu coração

como ave migradora

que também não tem pressa

e, por isso, não voa.



quarta-feira, 18 de setembro de 2013

Urgência




Traz-me o olvido

aquela terna aceitação

tão plena,

que é urgente hoje procurar

um súbito navio em pleno mar...

e partir e não voltar.



segunda-feira, 16 de setembro de 2013

Fatum




Se te sentires sozinho,

não esmoreças;

também as flores colhidas

jazem numa jarra esquecidas,

mas, sem  lamento,

enfeitam qualquer momento.





domingo, 15 de setembro de 2013

Voo de pássaro




Difícil linha perpendicular

que atravessa

todo o pensamento aprisionado

numa alma dolorida,

liberta-te, como numa corrida,

e voa

para além do horizonte.



sexta-feira, 13 de setembro de 2013

O eterno retorno




Se fosse hoje primavera,

renovando-se na estação a natureza,

teria o meu coração

largueza

e colheria no verde manto

o perdão

que reconcilia

como por magia.



quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Buscando




Há dias li duas frases lindas

evocando vinte e sete anos felizes.

Fiquei por isso a pensar

que se há árvores que florescem,

porque as dores não se esquecem?


E então vi-te Caminheiro, da longa jornada,

e abençoei a tua estrada da minha tão desviada.





quarta-feira, 11 de setembro de 2013

Roteiro




Durante a tarde, passeando

nos meus pátios,

curvo-me para apanhar alguma folhagem

caída dos plátanos silenciosos,

e parece-me que todo o edifício velho

é esquecido antes do acontecer

das gentes que lhe dão o viver.







terça-feira, 10 de setembro de 2013

Estival




Ocasional e vaga,

a palavra, não sendo sincera,

é mera quimera

que brota sem jeito

num mundo imperfeito.





segunda-feira, 9 de setembro de 2013

Recomeço




Hoje, sob as árvores dos pátios

caminhei,

como se num assombramento

o Tempo me chamasse a qualquer momento.



quinta-feira, 5 de setembro de 2013

Murmúrio




A nebulosa vastidão do mundo

encontra-se no meu ser mais profundo.


E é um murmúrio

que sempre desvanece

a manhã do dia que anoitece.






quarta-feira, 4 de setembro de 2013

A multidão




Nesta hora, caminhando

pelo mundo,

há rostos feridos e esgotados...

todos silenciados.


E eu, entrincheirado no meu desgosto,

desejando que ainda fosse agosto,

verto uma lágrima por mim,

embora sabendo

deste mundo assim.



terça-feira, 3 de setembro de 2013

Colheita




Colhe, na oportunidade lançada,

o fruto que te leva

às profundezas do teu ser,

pois só aí encontrarás

a glória que alcança

quem vive a verdadeira esperança.







segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Por acaso




À sombra da árvore finissecular,

medito

um poema que exacerbe,

mas o tempo quente provoca-me a febre

e tudo à minha volta é vertical.

Bem sei, não tem mal.

Fica o poema por fazer

tanto e tal quanto o meu viver.