sexta-feira, 31 de maio de 2013

Simplesmente


porque veio o sol,

me lembrei de cada ínfima coisa

que, num antes, povoou a minha vida.

Foi uma memória sentida

a recordação

de que acordava só para ver

um dia novo a nascer

em qualquer tempo de qualquer estação.



quinta-feira, 30 de maio de 2013

Ontem


o tempo não passava

e onda a onda o mar quebrava

contra os rochedos da inquietação;

e, agora, o tempo onde mora?,

que tão triste a paisagem chora

por o alvor do esplêndido dia

não permanecer como devia

para sempre

numa única trova.









quarta-feira, 29 de maio de 2013

Ausência


do Sul e da Natureza

e da Casa branca com a barra azul.

Saudade, enfim, de ser

como uma planta a nascer

sem outra condição

nem ter senão um verão.



terça-feira, 28 de maio de 2013

De calcário


é esta flor, Caminheiro,

que te ofereço, para que vejas

no começo da matéria mineral

o esplendor do orvalho

que, em cada dia,

o trabalho da vida anuncia.



segunda-feira, 27 de maio de 2013

Como saber


se a linha desta mão

chega até ao coração?,

se é tão longa a distância

mesmo que o braço se dobre

e no peito ela se pouse.




sábado, 25 de maio de 2013

Ofício


Da tristeza de não compreender,

só vejo o sol a morrer

no entardecer

de cada fim de dia. Dirão alguns que é mania;

mas é antes um ofício

imposto,

que sem amor nem gosto,

carrego desde que me levanto

como se não houvesse outro encanto.









sexta-feira, 24 de maio de 2013

Lazer


Um banco ao sol,

na praça, do sítio onde eu moro,

consegue anular a distância

que vai até àquele cais

de onde partem os veleiros

para correrem o mundo inteiro

como se definida uma rota

não mais houvesse derrota.


Por isso, sento-me no banco, por volta

do meio do dia, e viajo sempre tão longamente

que os prédios ao meu redor

parecem-me

gigantes Adamastores

alquebrados

pelos lamentos dos seus amores.






quinta-feira, 23 de maio de 2013

Confiança


e esperança não se podem

perder,

nem à beira de morrer

da morte mais dura e inclemente,

senão o Homem

entristece e todo o sonho vão

se esquece

sem ter despontado no pensamento

e florido um só momento.



terça-feira, 21 de maio de 2013

Soletra


e não tenhas pressa,

que a palavra em pedaços

encerra a mesma condição

que o Homem nesta imensidão.



segunda-feira, 20 de maio de 2013

Um dia normal


Sem pressa, despontam as flores

na natureza; e são mais belas as árvores

erguidas na tessitura dos campos,

se, no espelho, me olho a lembrar

todo o passado,

em que antes do ser,

não havia a flor nem a árvore,

mas apenas o arquétipo

escolhido para dar ao mundo algum sentido.





domingo, 19 de maio de 2013

Letargia


Inimiga das horas

e dos dias que escorrem

para aquele fim

em que me hei de esquecer de mim,

és o agravo

deste momento

em que só o Tempo

sabe de cor a Dor que eu sinto assim.




sábado, 18 de maio de 2013

Infinito


é o Tempo... será?,

que no espaço súbito do Vazio,

atómico e tumular,

não se vejam as horas a espreitar.





quinta-feira, 16 de maio de 2013

Acordar


tão de pressa que o dia não amanheça

e não haja senão a escuridão,

desde o outono ao findar do verão.


Assim, não passariam as horas

de uma longa noite onde só morasse

o sonho da imaginação

a única verdadeira emoção.






terça-feira, 14 de maio de 2013

Inconfidência


A ideia exige realização,

senão murcha e definha

sem que se saiba o que ela continha.



segunda-feira, 13 de maio de 2013

Insistência


da luz na madrugada,

apesar da noite que nos assombra

numa gigantesca

onda que tudo cobre,

mesmo quando, à volta,

só há um silêncio nobre.









domingo, 12 de maio de 2013

Sopro


Aventura de começar o dia

como se um vento que vem de longe

despenteasse os cabelos,

apenas para que fiquem mais belos

do que aquelas ideias arrumadas

que levam os homens sempre pelas mesmas estradas.



sábado, 11 de maio de 2013

Branco sinal


Sempre sonha a Criança

um futuro de esperança eterna

como se nada nunca

acontecesse que perturbasse

o mistério

do instante exato

em que crescendo

se vê a esperança morrendo.






sexta-feira, 10 de maio de 2013

Fio de água


correndo pela encosta,

tão persistentemente que já nem sei

se há uma razão esquecida

para correr tanta água nesta vida.



quinta-feira, 9 de maio de 2013

Enquanto longe


A seara da terra é a semente

que o trigo contém;

e se tão longe está o paraíso,

como da semente está o pão,

digo-te que sempre é preciso

atravessar o deserto

que é a solidão.


Por isso, em dia da espiga,

a Vida obriga a confiar no tempo

e em toda a renovação.





quarta-feira, 8 de maio de 2013

Colheita


Em versos, as palavras

são o sol

de mais um dia,

sementeira de um momento

em que talvez

irrompa da terra

o fruto acre do pensamento.




terça-feira, 7 de maio de 2013

Cristalizações


Cada momento fixa-se na nitidez do tempo

como coisa inamovível,

qual rochedo contra o qual

brama um mar de além

do passado de onde tudo vem.









segunda-feira, 6 de maio de 2013

Oriente


e mar são o meu fito

de navegante

e, embora me perca um instante

em rotas de vielas

escondidas,

tem clareza a minha vida,

no dobrar daquela esquina,

onde, rota e pequenina,

aquela tão pobre quanto eu

pede uma moeda por Deus.



domingo, 5 de maio de 2013

Borboleta


preta, ziguezagueando

de flor em flor,

parece

quase tonta

nesta hora singela de calor.


Mas o meu supremo encanto, do dia quase findo,

é a cesta dos malmequeres

que me ofereceste

e que tornou este dia o mais lindo.




sábado, 4 de maio de 2013

Poema de Primavera


Esta incidência da luz no mais azul

do céu

encanta-me e entristece-me,

quando à noitinha,

a luz, que é a rainha,

se desvanece no breu.


Por isso, hei de velar toda a noite

para que no amanhecer

eu seja como a luz a nascer!



quinta-feira, 2 de maio de 2013

Movimento


Foi só um instante, o tempo

que passou,

não sei como, voou,

perdeu-se,

como se se esquecesse

e se apagasse

tudo o que o passado mostrasse.


E agora o relógio eletrónico

brilha desfiando os segundos

daquele que é o teu novo mundo.



quarta-feira, 1 de maio de 2013

Folhagem


Há já uma folhagem primaveril nas árvores,

que parece terem despertado

de um sono de inverno.

Talvez que, na natureza,

sejam as árvores

as primeiras a acreditarem

numa mudança verdadeira.