Não procuro, no movimento do mundo,
a Alma da Vida,
antes a colho na vide seca da videira que não deu fruto,
assim como eu que deponho as armas e não luto.
Não procuro, no movimento do mundo,
a Alma da Vida,
antes a colho na vide seca da videira que não deu fruto,
assim como eu que deponho as armas e não luto.
É incerto o tempo que se escoa
como se não houvesse outro tempo
que este acabado de nascer
num Coração que bate, bate, até morrer.
Os meus passos em redor da casa
levam-me
àquela estrada que conduz ao antípoda do mundo
e onde aí serei um vagabundo.
Não chorar pela multidão adormecida
nem pela crueza da vida
nem pela fome guerra e atrocidade
não chorar pela devastada mocidade
e será consolo em todos os momentos de dor
apenas um Sonho redentor.
É invisível esta dor no peito
fosse ela uma mancha sépia na pele
e seria como do tempo um sinal
que mostraria ser igual ser e não ser imortal.
Não é vã a palavra de que se constrói
no poema uma certa arquitetura do mundo
e quando as aves vêm pousar
ou quando as estrelas vêm brilhar
um mundo justo ganha uma forma plena
vinda dessa canção pequena.
Fica a minha Alma mais leve
quando a eterna Criança da Esperança
vem habitar o meu Coração.
E então caminhamos e conversamos sobre a Beleza das coisas
e tudo é tão puro e natural
e tão vibrante de espantosa magia
que no mundo por um instante é sempre e apenas dia.
É noite. Acende-se de estrelas a minha janela
e eu penso que a imensidão do céu
me visita por um momento
em que ainda desperto
eu acredito que a Luz está mais perto.
Lembra-te
e não esqueças
que para que amanheça no teu Coração
nenhuma noite será em vão.
Quando voam os pássaros
e eu os vejo a voar
algo fundo em Mim começa a se alegrar
e nessa inteira e sublime Liberdade de se ser
mora em Mim uma saudade de ter tido esse viver
mas na minha humana condição
livre é apenas o Coração.
Na grande cidade, ao anoitecer, iluminam-se as ruas
e esta luz elétrica abafa a negra escuridão
mas, no meu Coração, de urzes e giestas agrestes
há apenas Sonhos campestres
e a lua e a estrelas apontam a imensidão.
Mergulho no movimento da onda e escrevo
um hino a este dia
e Tu, apenas Tu, saberás
que é tão lúcido quanto o espírito da Paz.
Há um horizonte que me cerca
uma muralha invisível no sopro da noite
aprisiona e me emudece
como se não houvesse uma prece.
Não adies o abraço nem o beijo
que como um canto de ave num beiral
é a cada instante sem igual.
De permeio no Coração
um cofre bem guardado que contém
a paz o perdão o sacrifício e o amor
que santificam toda a dor.
Agarro com a minha mão todo o céu
e não deixo que nem uma gota se perca
desse azul silente
assim a minha Alma se sente
plena dessa cor de mar
por onde tenha de passar.
Se puderes, imagina um barco à vela
e um triciclo cor-de-rosa
e de Paz será o caminho
num regalo de muita e muita cor
que nem a escuridão esquece
mesmo quando é noite e escurece.
Se tiveres uma jarra com flores,
renova a água desse vaso
e verás florescer
o que está condenado a morrer.
Este é o meu mural num prédio em ruínas,
esta é a minha canção de silêncio
numa tarde em que sós
somos mais do que apenas nós.
Atravesso a Paz de olhos abertos
e encontro, nesta claridade inicial,
o rosto da humanidade irmã da minha.
E, felizes, e irmanados,
pomos no regaço da Esperança
a semente do tesouro
de um novo tempo vindouro.
Dá-me as tuas brancas flores
que junto ao ribeiro florescem
e farei uma grinalda festiva
para o dia da suprema Liberdade
aquele dia da Verdade.