Deixem correr o Tempo
como uma folha de papel rasgada
que já não vale nada
mas tem uma memória nela gravada.
Deixem correr o Tempo
como uma folha de papel rasgada
que já não vale nada
mas tem uma memória nela gravada.
Algures na esfera nebulosa
se tece uma prosa
e um verso
e pode ser um canto de outono
em que uma a uma a palavra vem
como folha que cai
e que não regressa mais.
Pego na chávena e tudo é automático
e mecânico -
o fio de líquido negro e aromático de café
enche a xícara -
e, então, eu penso que não me apetece beber
e que a minha sede do viver
a minha ânsia da vida
é como um sopro livre que vem
e passa e não se detém.
Ó tempo de vir a ser,
Ó tempo
que sabes aquilo que é
e aquilo que será
nascido dum instante profundo de Paz.
Um verso antigo veio ao meu encontro
e fez e desfez o poema de agora
onde a Saudade se demora.
Amanhece e a alvorada esquece,
e vem a noite e já não lembra o dia,
oh, vida sombria,
perde-se o tempo em nós
e ninguém ouve a nossa voz.
O sol nasce no Caminho
e é sozinho
que ilumina e conduz
cada homem com a sua cruz.
No meu ombro molhado, serena e quente
a tua mão da mão ao coração
encerra uma lição.
Espaço a espaço se iluminam os andares
e o meu olhar demora-se neste entrecortado de luz
que a uns seduz
mas que a Mim revolta como uma desgraça
ser o sinal que o dia passa.
Coisa inútil é o pensar,
o partir e o chegar.
Deixei que a realidade,
esses palmares à beira do meu rio,
viesse ser o Sonho de um breve instante -
um mundo que pulsa em Paz para diante.
Antes que chegue o frio do tempo de Natal,
deixo que o murmúrio das fontes
que só existem na magia do pensar
ecoem pelas salas e pelos quartos perdidamente
como num amor sempre presente.
A lua tem duas faces,
a que resplandece com o brilho do sol
e a que se oculta e vive em segredo -
assim é também no homem
esse supremo desafio
e tanto que já nem sei se hoje choro ou rio.
As palavras do caderno viajam
na espiral do pensamento
e não há cansaços
em cada um desses passos.
De oriente a ocidente, caminho
por estas ruas enegrecidas,
e nelas deixo a minha vida
como se o destino ditasse um fim
fora e dentro de Mim.
Passamos indiferentes
a estas gentes
que nas noites habitam as cidades
e que são sempre velhos e pobres
sem nobreza nem distinção
dentro do nosso Coração.
Por onde caminhas Tu sem bordão
quando o cansaço te quebra o andar
e as rugas da tua mão
te lembram o muito procurar
é outono na vida bem o sabes Tu
é outono e até o olmeiro está nu.
Rainha e Imperatriz
do tempo,
é a Palavra mais bela
a que traz o silêncio com ela.
Não termines o dia sem desfazeres a grinalda
que ergueste na manhã
para humanamente te coroares
herói desta viagem
que atravessa todos os mares
que está em todos os lugares
onde um homem ganha o pão
com o trabalho da sua mão.
Primeiro o meu espírito
no caminho se perdeu
(e foi uma noite de breu)
até que ele regressou
à luz inteira do que sou.
Havia na chuva um silêncio
quando jovem eu adormecia
e aquela musa distante
no Sonho para Mim sorria.
Tempo foi. Tempo passou.
E a musa não se quedou.
Cada Flor tem em si o mistério
da Vida - floresce
e mergulha no Silêncio
e torna a florescer
até um dia em que não pode mais morrer.