Piso a terra inteira numa passada
e é isso quase nada
na viagem ao redor de Mim
que não tem um fim.
Piso a terra inteira numa passada
e é isso quase nada
na viagem ao redor de Mim
que não tem um fim.
Até o mar tem lágrimas
que escorrem pelos pinhais,
e é passar o Bojador dos homens
a dor a que não se volta mais.
Nem sempre é azul o céu no meu olhar
e nem sempre vejo estrelas
na noite,
quando me deito a imaginar
mas sempre o meu pensamento
se detém
perante as léguas que existem para Além.
O paraíso não está num lugar
a que se possa chamar
um sítio
ele está dentro do Coração
e há quem o encontre e quem não.
Avança os teus pés na estrada de abril,
Poeta que procuras
a Liberdade
pois, nesse assomo de verdade,
és eterno, não tens idade.
À luz de abril, ao entardecer,
colho pétalas
guardadas por entre as páginas dos livros
e olho para cada uma delas
como se aí se encerrasse um grande mistério
a vida e a morte
que acontecem à sorte.
Como um colar de pérolas que se rompeu,
também o meu Coração perdeu
o gesto da Paz
que um sorriso traz
mas a memória o canto da Alma glorifica
e cada pérola pura na minha mão
encerra um condão.
Desisti de procurar no labirinto
daquilo que sinto
um verdadeiro caminho
escavo, agora, com as minhas mãos
no terreno fértil do pensamento
e planto nele cada emoção
com o rigor de um agricultor
que tudo semeia com Amor.
Nas alturas, com as aves,
é onde o meu Coração está
e, neste instante do fim,
a terra e o céu
aparecerão em Mim.
Dança e rodopia na grande altura
de ser gente,
a bailarina inocente
até que passados os verdes anos
desenganada da notoriedade
sente que É na verdade.
Vem do poente a luz com que o dia se encerra
e muito baixinho, com carinho,
soletro sílaba a sílaba
um verso
como quem procura num gesto de ternura
num ato de compaixão
olhar cada homem como um irmão.
As árvores, nas traseiras da casa,
permanecem inteiras almejando o céu
e, de ramos nus,
ainda sem folhagem,
são do homem uma bela imagem.
Meio céu era azul e puro
e metade da terra estava sombria e gasta
assim também nesta caixa de cartão
onde está guardada a minha imaginação.
Os outros têm lembranças
como tranças de crianças guardadas
em caixas de papelão -
mas não têm imaginação
nem fé
nem suavidade nem esperança
para aguardar o sim
do Sonho que vive em Mim.
Podem os deuses
a sombra tornar em luz
e os pássaros silenciar
que nesse gesto tão diverso
cabe todo este meu verso.
No jardim da primavera,
um tesouro de flores
está pousado à minha beira
são belas as cores
são sedosas as pétalas
mas de entre todas as coisas que vejo
aquela única Rosa é o que eu mais desejo.
O dia que nasce
e é renascido
no seio da noite encontra abrigo
é de onde há de florescer
tal fio de vida
sem se desvanecer.
Ali é em Mim o sítio
onde mora o belo e puro entardecer
e nesse vislumbre do viver
um lugar eu poderei ser.
O respirar do centro de Luz
em nós,
peregrinos na suma distância dum céu,
traz ao Coração
a lembrança da Redenção.
De tanto caminhar num só lugar,
minha Alma entonteceu
e em Mim anoiteceu.
Das folhas à raiz, da árvore à substância,
tudo parece ser e conhecer
o movimento infinito do viver.
E, se a manhã é mais fria,
se a tarde é mais quente,
lembra-te todavia
que moras entre gente.
Há mosaicos no meu Coração,
pisados desde antes da minha vida acontecer
e nessa ardósia agora reescrevo
um outro movimento de Palavras
onde há me-do coloco amor
e o caminho é libertador.
A casa permanece na penumbra
deste tempo
e ela que foi aconchego e deserto
no meu Coração
acolhe agora aqueles que virão.
Movimento, movimento, e um ruído
que parece trazer
o futuro a acontecer
por entre a amplidão das pessoas
gigantes na roda
do devir
e do Ser a cumprir.
Em cada degrau da escada, um verso
rescende em luz
e é cada um deles que me seduz
quando no cimo do horizonte
eu vejo correr a água de uma fonte.
Das mil maravilhas da vida, um sorriso
num rosto
e a confiança no Coração
são tão belos como uma oração.
Há no meu pensamento um lugar
onde sempre é o que era
e é sempre nele primavera.