O ir e vir das coisas,
como nas entrelinhas um outro texto,
repousa no movimento
de quem se conhece por dentro.
O ir e vir das coisas,
como nas entrelinhas um outro texto,
repousa no movimento
de quem se conhece por dentro.
Quando o dia chega ao fim,
há em Mim,
um ancoramento de navio,
como, se tendo navegado em águas revoltas,
não houvesse senão o fito
de ver o infinito.
É na casa que as estrelas querem morar
e a luz delas à noitinha,
nítida e nua,
parece-me tão natural,
como em sonho um pensamento
que dura por um momento.
Os petizes vivem a eternidade em cada dia,
um pião e um cordel,
um avião,
e as cartas de jogar
fazem a magia - e eu, neste jardim junto ao mar,
aos poentes vou buscar
a perfeita liberdade
num tempo sem idade.
Sem distância nem o longe nem o perto
aqui neste agora tudo é
e até parece uma promessa cumprida
a urze o leite e o mel
escorrem por milagre dum papel
É igual cada dia que nasce diferente,
pois no coração dos sentidos
o que se vê
é apenas o que se crê.
Deixei as letras à solta por entre as ondas do Mar
e as palavras com cheiro a maresia
em emoção eclodiram
e talvez, uma primeira vez,
um verso se desfez.
Esta é a palavra mais certa,
a palavra completa,
que inteira,
perfeitamente anuncia
um pregão
a palavra ilusão.
Realidade e sombra da realidade
na vida a metade
e neste viver genial
não há dor nem nenhum mal.
É a esperança perdida,
quando se colhe um fruto belo
pois é passageiro todo o momento
em que eu trinco esse pedaço
e não fica nenhum laço.
Pela fresta da janela, a brisa é uma música de sopro
que me sustém
e a brisa não é de ninguém.
Também assim é um verso incompleto,
como um sopro levantado,
que se espalha por todo o lado.
É de malvas este jardim
e de sonhos
inquietos, quando estamos despertos -
mas o ver uma pequena criança brincando
que parece o mar respirando
enleva e demora
o meu pequeno olhar nesta hora.
Toda a manhã dum céu cinzento escuro
caiu uma chuva miúda
como se saudasse o caminho e a hora
em que a gente chora.
Brilha o sol neste pensamento de esperança,
se do tempo em rigor eu sei,
que justa é a lei.
Quem dera fosse primavera
e um sopro desse além
aqui estivesse à espera
como se esperasse por alguém.
Escorre pelas páginas do livro
o negro dos caracteres
e nesse charco de negritude
é que o Poeta adivinha
a Dor que é tua e minha.
Entre um e outro pensamento,
há um espaço
que teima em não pensar
e, sem memória,
aí vivo infinitamente em glória.
Sentado sobre o rochedo, procuro
na linha do horizonte
um vislumbre do amanhã
navio que do outro lado do mundo partiu
e que, a chegar, ainda ninguém viu.
A eternidade passa e o que fica
é este instante imorredoiro
também no sono à noite há oiro
por um momento experimentas a morte
e acordas mais forte.
O canto do pássaro atravessa as paredes deste quarto,
onde só o sonho habita,
e o meu olhar esse canto fita.
Não acaba o dia sem que a neblina
se cole à vidraça
e baça
não deixe florescer
o pôr do sol no meu ser.
Que festa é esta,
que o meu espírito sente e fita,
agora que cada bocado de um caderno desconjuntado
rima e verseja
sem que Hipocrene o veja.
Sopro de cristal sobre a encosta,
e gélido e frio
o ar
dos desencontros nas mesas dos cafés
onde há um instante
puro e singular
na quietação dum verão
eu te confiei a minha mão.
Serão mil os sóis no universo galáctico,
que infinitamente luzem,
mas o meu Sol, nesta minha fronteira,
tem a Beleza primeira.
E assim é também com tudo o que está perto de nós
que nos lembra que não estamos sós.
Da ave, branca e pura,
que habita o Coração de Mim,
te direi - que onde está agora não sei.
A pequena casa branca para sempre perdida
é um sinal da própria vida,
que esquece, quando entardece,
o tempo do amanhecer,
assim também no nosso ser.
Entre o não ser e o ser,
há uma avenida de áleas floridas que se abre
num único momento
que nasce dentro.