terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Sombra raríssima


sombra. Penumbra que desce ao entardecer

e que, nos veios da noite, se agiganta como se

num alguidar, pousado, o pão levedasse.

Por isso, nestes dias, tão de sol,

a luz clara 

sonhou um janeiro

sem durezas de inverno -

máxima estranheza

da verdadeira Natureza.

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Alvoroço


pelo Mundo, alvoroço.

Talvez que, neste entardecer,

de gente, ao frio, a gemer, soem

ao longe, e tão perto, os tambores.


Mirífica, a paisagem e o sol escondem os clamores.


domingo, 29 de janeiro de 2012

Cantata


Ontem, à noite, mergulhei na Alfama

do fado e dos fadistas - retiro silencioso

de que, na penumbra, ecoam as vozes e as guitarras.

Ao fundo o rio, que serpenteia em direção

ao Mundo, tão perto a Sé

e o Aljube.

E, tão raro e fugaz,

recordo o tempo em que vivi

ali, naquela mesma rua, há um quarto

de século; sem fado,

na altura, o que vibrava em mim

era uma cantata

feliz  de uma antiga Lisboa.


Hoje, povoa o meu pensamento esse estranho

momento em que habitei em Lisboa,

sem ter ouvido o fado-canção

rente ao Coração.

sábado, 28 de janeiro de 2012

Sonho em prata


Sonho da realidade em prata.

Transcorro meio século, e sei dos veios da luz

sempre, desde sempre,

gotejando e escorrendo,

gota a gota, fio a fio,

no écran onde estou escrevendo.


Por isso, a nuvem ligeira, passageira no Céu,

me ilumina: em prata, hoje, tal é a sina.





sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Estrela guia


Este poderia, e pode até, ser o nome de um espaço

dedicado a um movimento zen de natureza transpessoal;

mas, antes, prefiro imaginar

que seja o nome de um astro perdido no Céu:

estrela que guia,

sonho que é meu.

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Borboletar


Na cadência dos dias, cada coisa

encontra um poiso certo: a chávena, o copo, o prato

arrumados nas prateleiras. Do mesmo modo,

cada mulher e homem.

Por isso, um desvio na estrada alcatroada

da borboleta discreta

implica uma contradança:

cada Ser tem um só caminho de esperança.

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Gramática


Boa, velha, gramática, aquela que aprendi

na Escola Primária... depois disso, a fragmentação

tem sido tanta!, que de nada adianta.


Saber ler e escrever? Saber taxionomizar?

Naufrago, o poema espera

não pelo Ser do sentido,

mas pelo bisturi

da dissecação: janeiro - nome comum,

contável ou não.

terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Tempo de futuro é o Tempo


Quando logo, à tardinha, mergulhar nas palavras do G.,

saberei do futuro o Tempo.

Então, as horas e os minutos, que virão, serão

como os astros do Céu, no seu movimento previsível,

um Dragão, que devora em chamas

cada instante presente que jamais É

de tão atómico, de tão frágil!

Assim, resta-me o Tempo futuro que é o Tempo.

O Tempo dos morangos e das melancias,

e das uvas vermelhas bravias, que, num pic-nic

de primavera, saborearei,

simples quimera,

como se a Vida não fosse senão uma espera.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Carta de marear


escrevo-te uma carta, ó mar!,

tão breve, frio, distante,

que, se pudesse navegar, não sei se sempre partiria.

Onde me levaria o teu jornear,

que searas alcançaria?, se ao outro lado, ó mar!,

eu chegasse, quem me traria?

E os rochedos, ó mar!, que forças escondidas hão,

a vencer os medos

daquele maior segredo,

o mostrengo, teu senhor?

Por isso, ó mar!, me despeço, sem cruzar

ondas nem sal, nem maresia,

e até sempre, sem regresso,

de joelhos, te peço,

sê até sempre a Via.






domingo, 22 de janeiro de 2012

Andamentos


Allegro andante... talvez.

Sim, talvez tenha sido esse o compasso

que escutei e que maravilhou aquele meu dia numa sinfonia.


Mas, depois, escureceu. A noite desceu

e a música ficou perdida. Que aconchego na vida!,

ter uma pauta em branco, em branco

para escrever

cada melodia querida.



sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Gelidamente


Gelidamente, mas ao Sol, o corpo ganha ânsias

de um desconforto suave no recorte frio do mês de janeiro.

Parece que as árvores despidas configuram

uma natureza triste,

como se o passado tivesse sido roubado

a todos quantos, no presente, alçam os olhos para um futuro,

tão vazio, que sem narrativa ulterior,

trouxesse, apenas, pelo ar, raras sementinhas,

nascidas no gesto carregado deste amanhã sem ontem.

Então, gelidamente, mas ao Sol, germinam

as sementes que serão

só e apenas

flor e fruto de Estação.

domingo, 1 de janeiro de 2012

Ano novo


começa em janeiro, quando o luar é mais

prazenteiro... alguém mo disse assim um dia,

em janeiro a lua acresce o dia.