Horizonte
Traduz a chegada de uma mulher à presidência
da Assembleia da República, em Portugal, uma
substancial e efectiva mudança de paradigma
social em relação à posição das mulheres em geral
na sociedade? Creio que efectivamente não.
As demais, trabalham fora de casa e em casa, cuidam
dos filhos como podem, são mal remuneradas, e
lutam (ou desistem de lutar) por uma partilha
e divisão de tarefas no lar que sempre dificilmente acontece.
Nascer mulher transporta uma marca de dificuldade
acrescida. Serão do passado, aquelas que morreram
com a amargura de lhes terem imposto que saber ler e escrever não era
necessário para quem apenas teria filhos e labutaria
no campo e na casa. Mas, são bem do presente as que, embora tendo
instrução, se vêem subjugadas pela necessidade de serem
o garante de alguma estabilidade e segurança de outros.
E esse sentimento de preocupação e até de sentido de responsabilidade
em relação a outros é uma marca de natureza bem feminina,
que, ao mesmo tempo que inibe, enobrece.
Por isso, evoco a audaz linha do horizonte que pode,
e deve ser, não a linha que marca
um fim, mas a linha que vela um outro horizonte para além.
Por isso, evoco Hipacia: que horizonte imenso não foi subtraído
do seu olhar? Que outro outro horizonte também não verei eu jamais?
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